quinta-feira, 1 de março de 2012

A imagem do publicitário santo.

Tarde da madrugada na pequena agência, naquelas horas em que o sujeito já não sabe se é melhor ir embora ou dormir ali mesmo para adiantar os jobs da manhã seguinte, um diretor de arte foi até a copa ver se tinha sobrado uma fatia da pizza daquela noite. Abriu a caixeta achatada de papelão e só encontrou uma azeitona murcha. Serviu.

Quase dormindo em pé, ele ficou ali, empurrando o caroço com a língua de um lado para o outro da boca, até parar os olhos sobre aquilo que quase o matou de susto.

– Meu Deus do céu! – gritou perplexo.

O berro atravessou as salas derrubando tudo como bronca de patrão, e a meia dúzia de almas que restava na agência correu até a copa e encontrou o criativo pálido, estarrecido, caído sobre os joelhos. Com as mãos entrelaçadas na altura do peito, ele olhava fixamente para a caixa da pizza.

– Que aconteceu, Coruja?

Estava mudo, o coitado.

– Fala, pô!
– Coruja, não assusta a gente, bicho!

Coruja abriu a boca e babou um caroço de azeitona.

– Viram... na caixa? – perguntou com uma voz trêmula, irreconhecível.
– Que é que tem, Coruja?
– Na tampa. Na tampa!

Em dois segundos, os criativos estavam todos de joelhos.

– Nossa Senhora!
– Mais pode Deus!
– É um milagre!

Na parte interna da tampa da caixa da pizza, estampada misteriosamente pela gordura do queijo, estava a causa do espanto: uma inexplicável imagem do Washington Olivetto.

Os primeiros curiosos chegaram minutos depois para ver o portento. Aquela imagem só podia ser um recado divino! A novidade correu solta no mercado e agora mais e mais pessoas surgem do nada para ver isso de perto.

– Faz um pedido pra imagem, boba! – sugeriu a moça da faxina à recepcionista da agência, que estudava propaganda e havia meses esperava uma vaga de estágio na criação.

Religiosa, ela pediu em voz alta:

– Eu quero o meu estágio agora!

No instante seguinte, tocou o telefone. Era o Eunuco, estagiário vitalício, avisando que tinha quebrado a perna e sairia em licença médica. Sua substituta seria a recepcionista.

– Milagre! Viva Santo Olivetto!

É claro que uma notícia dessa tinha que parar na imprensa e virar comoção nacional. Resultado: romarias não param de chegar à agência a qualquer hora do dia e da noite. Filas imensas, organizadas pela polícia e por publicitários desempregados voluntários, dão várias voltas no quarteirão.

No jornal das oito, entrevistas com romeiros e fiéis chamam a atenção dos telespectadores mais incrédulos.

– Eu fiz uma promessa para a imagem da caixa da pizza e fui atendido.
– E o que você pediu?
– Pedi para mostrar minha pasta ao Rui Branquinho!

Os depoimentos aparecem de todos os cantos.

"Ganhei um aumento de cem reais e ninguém me pediu pra chegar mais cedo."
"Saí da agência às sete horas da noite em ponto."
"Devolveram minha caneta."
"Minha tia parou de beber!"
“Saí do armário e meu pai achou ótimo.”

Especialistas estrangeiros, atraídos pelo fenômeno paranormal, desembarcaram por aqui para fazer uma série de análises e descobrir os fundamentos da manifestação misteriosa. Até agora, nada constataram. Exceto o fato de que as faculdades de propaganda bateram novos recordes de procura por vagas, o mercado de souvenires decolou com a venda de camisetas de Santo Olivetto e o patrão do Coruja vai ganhar a maior grana cobrando entrada dos fiéis que querem ver a imagem.

Enquanto isso, em algum bar da cidade, dois diretores de criação desaforados procuram a pulga que fica atrás da orelha.

– Será que é o fim do mundo?
– Nada! Isso é mais uma do Washington. Não conhece a peça? Se ele fosse milagreiro mesmo, o Corinthians já tinha vencido a Libertadores.

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